Há duas licenças que os pais
podem gozar depois de terminada a licença parental “normal” (antes conhecida
como “licença de maternidade”):
1) Uma “licença parental
complementar” de 3 meses (ou, em alternativa, de trabalho a meio horário
durante 12 meses), gozados de forma contínua ou repartida (o direito é de cada um dos pais, ou seja, os dois em conjunto podem gozar 6 meses).
2) Esgotada essa primeira licença, a mãe / pai pode gozar uma licença bastante maior, também de forma contínua ou
repartida, que pode ir, no total, até 2 anos de duração (ou 3 anos, a partir do
terceiro filho), e que se designa “licença para assistência a filho”.
Em ambos os casos, trata-se de
um direito cujo exercício não carece de autorização da entidade patronal: basta
ao trabalhador informar por escrito, com 30 dias de antecedência, que irá gozar
a licença e em que período. A entidade empregadora não pode recusar.
A informação divulgada sobre
este assunto presta-se muitas vezes a alguma confusão
e muitos pais pensam que só têm
direito àquela primeira licença (a licença de 3 meses) desde que a gozem imediatamente
a seguir à licença parental “normal”
(ver, por ex. aqui)
E como a segunda licença (a de 2
anos) só se pode gozar depois da primeira, muitos pais concluem que, se não
tiverem gozado a licença de 3 meses logo a seguir à licença “normal”, perdem também
o direito à segunda licença.
Mas não é assim: a licença de 3
meses não tem de ser gozada logo a seguir à licença parental “normal” e pode
ser gozada em qualquer altura até a criança fazer 6 anos (artigo 51.º do Código
do Trabalho). O que acontece é que essa licença só é paga a 25% se for gozada
imediatamente a seguir à licença “normal” (artigo 16.º do DL 89/2009). Por
outras palavras, se não for gozada logo a seguir à licença “normal”, não é
paga.
E surge aqui a primeira
perplexidade perante o regime legal. Não há qualquer justificação para que a
licença só seja paga a 25% se for gozada logo a seguir à licença parental
“normal”. É incompreensível e é um obstáculo acrescido a que os pais tenham
acesso ao gozo desta licença (e, por consequência, ao gozo da segunda licença).
Mas há um obstáculo muito mais
grave. É que, embora os 3 meses possam ser gozados até aos 6 anos do filho de
forma repartida (não têm de ser 3 meses seguidos), a lei estabelece um limite absurdo: só pode ser gozada num máximo de três períodos interpolados (artigo 51.º, n.º 2 do
Código do Trabalho). Por isso, pelo menos um dos períodos da licença nunca
poderá ser inferior a um mês.
(exemplos de gozo interpolado
em três períodos: um mês + um mês + um mês; mês e meio + um mês + 15 dias; dois
meses + 15 dias + 15 dias)
Ora, isto significa, na
prática, que o comum dos cidadãos fica sem possibilidade de a gozar, pois a
esmagadora maioria das pessoas não tem condições para prescindir de um mês de
salário.
Esta limitação é tanto mais
absurda que ela não existe no caso da segunda licença, a licença de 2 anos! No
caso da licença de 2 anos, não há qualquer limite para o número dos períodos
interpolados de licença que podem ser gozados, até se atingir o total de 2 anos
de licença. E isso permite, por exemplo, que se goze só dois ou três dias de licença, ou que se possa conceber um esquema regular que permita à mãe / pai
conciliar melhor a vida profissional com a vida familiar. Por exemplo, a mãe /
pai pode, num mês, gozar apenas dois dias de licença (um fim-de-semana de 4 dias por mês); ou quatro dias (dois fins-de-semana de 4 dias por mês); ou um dia por semana
(reduzindo a semana de trabalho a 4 dias); ou uma semana seguida. E isto faz
toda a diferença: é que, se o comum dos portugueses não se pode dar ao luxo de
perder um mês de salário, já lhe será mais fácil, mesmo que com sacrifício,
prescindir de apenas uns dias de salário por mês, para poder estar mais tempo com
os seus filhos pequenos (ou aproveitá-lo, pelo menos, nos meses de maior folga financeira, em que se recebe o subsídio de férias, ou o subsídio de Natal, ou o reembolso do IRS).
Se isto é possível na segunda
licença (a de 2 anos), tornando-a, de facto, uma licença mais acessível, por que motivo não é possível na primeira? É incompreensível.
Ora, como a segunda licença (a
de 2 anos) é subsequente à primeira (a de 3 meses), os pais, para terem acesso
à segunda, têm primeiro de gozar os 3 meses da primeira (artigo 52.º, n.º 1 do Código do Trabalho). E como, pelos motivos
explicados, serão muito poucos os pais com condições económicas para
gozar a primeira licença, na prática a primeira licença funciona, não como um
benefício, mas como um obstáculo legal. O legislador criou um
benefício de parentalidade e ao mesmo tempo criou um obstáculo injustificado
que impede o seu exercício à esmagadora maioria dos potenciais beneficiários.
O que sobra é um benefício apenas
acessível a famílias endinheiradas.
Estas duas licenças continuarão
a ser de uso muito limitado, por não serem pagas. Mas era possível, pelo menos,
torná-las um pouco mais acessíveis. O Pombal do Marquês vai propor a alteração da lei.
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